As sagas nórdicas são formas de literatura medieval escandinava que funcionam como registros históricos e genealógicos, sendo geralmente narradas em prosa. No entanto, como foram escritas séculos depois dos eventos, são construídas com base em tradições orais, manuscritos perdidos e uma certa dose de licença poética.
Em um estudo recente, pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia em Trondheim, usaram material genético extraído de um dente preservado para fazer um estudo de DNA do personagem-chave da Sverris Saga. Esse relato diz respeito ao rei norueguês Sverre Sigurdsson (1151–1202 d.C.) e o protagonista na história é conhecido como Well-man (Homem do Poço).
A saga conta que, enquanto o rei Sverre passava o inverno na cidade de Bergen, em 1197 d.C., seus inimigos “Baglers” católicos romanos invadiram seu Castelo de Sverresborg em Trondheim e jogaram o corpo de um homem no poço, para tentar envenenar a água da população. Essa “arma biológica” era o Well-man.
Análise genômica do Well-man
Em 1938, os restos mortais do Well-man foram encontrados no antigo poço do castelo. A datação por radiocarbono confirmou que o corpo tem cerca de 900 anos, e estudos feitos entre 2014 e 2016 mostraram que se tratava de um homem entre 30 e 40 anos na época da morte.
Coautor do estudo, publicado na revista iScience, o professor Michael D. Martin, do Museu Universitário da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, afirma em um comunicado de imprensa que esta é a primeira vez que um personagem histórico descrito em uma saga foi realmente localizado.
Para sequenciar o genoma do Well-man, o primeiro autor do artigo, Martin Rene Ellegaard, usou amostras de um dente do esqueleto. A análise mostrou que ele provavelmente tinha olhos azuis e cabelos loiros ou castanhos claros, e também que seus ancestrais vinham da região sul da Noruega.
Limitações da pesquisa do Well-man
Para fazer a amostragem do genoma do esqueleto, a equipe teve que remover a superfície externa do dente, o que invalidou a amostra para uso em testes posteriores. O procedimento também impediu a obtenção de dados sobre eventuais organismos patogênicos nos restos mortais.
Foi uma escolha difícil, comenta Ellegaard em um release, pois tiveram que ponderar entre eliminar os riscos de uma possível contaminação ou preservar ao máximo a integridade da amostra original. “Temos que considerar que tipo de testes estamos fazendo agora, porque isso limitará o que podemos fazer no futuro“, explica o pesquisador.
Esse tipo de análise de genoma antigo só foi possível, segundo os pesquisadores, pela disponibilidade de um grande banco de dados genéticos de referência atuais fornecidos pela deCODE Genetics da Islândia. “Quanto mais genomas antigos sequenciarmos e quanto mais indivíduos modernos sequenciarmos, melhor será a análise no futuro”, conclui Ellegaard.