O estresse social não é exclusividade humana: ele também afeta outras espécies, inclusive os peixes. Cientistas descobriram que os ciclídeos, peixes com uma hierarquia social bastante rígida, podem sofrer alterações cerebrais devido ao estresse relacionado à sua posição no grupo. Essas mudanças, causadas por um desequilíbrio de radicais livres e antioxidantes, podem ter implicações maiores do que imaginamos.
Estudos anteriores já mostraram que o estresse crônico pode causar danos ao corpo, como doenças neurológicas e até câncer. No caso dos ciclídeos, pesquisadores analisaram como o status social influencia o chamado estresse oxidativo no cérebro, publicando os resultados na revista Frontiers in Behavioral Neuroscience. “Descobrimos que os peixes de menor hierarquia apresentaram níveis mais altos de estresse oxidativo no cérebro”, explicou Peter Dijkstra, biólogo da Central Michigan University e coautor do estudo.
Hierarquia e o estresse nos cérebros dos ciclídeos
Os ciclídeos, populares em aquários, são conhecidos por seu comportamento social estruturado. Machos dominantes são maiores, mais coloridos e agressivos, enquanto os subordinados têm uma aparência mais discreta. Essa diferença física e comportamental torna a espécie um modelo ideal para estudar os efeitos do estresse social.
No experimento, os cientistas colocaram grupos de ciclídeos em tanques separados, permitindo que eles interagissem livremente com seus companheiros e visualmente com grupos vizinhos. Cada tanque tinha um território especial para os machos dominantes defenderem, reforçando a hierarquia. Em quase todos os casos, as estruturas sociais se estabilizaram rapidamente, com os peixes dominantes assumindo o controle.
Ao longo de semanas, os pesquisadores coletaram amostras de sangue e analisaram cérebros e gônadas dos peixes. O resultado? Peixes subordinados apresentaram maior estresse oxidativo no cérebro e uma menor capacidade antioxidante, indicando que suas células cerebrais estavam mais vulneráveis a danos. Já os dominantes, apesar de apresentarem altos níveis de estresse no sangue, pareciam ter cérebros mais protegidos graças a antioxidantes relacionados a hormônios reprodutivos.
Hormônios, estresse e proteção cerebral nos peixes
Os cientistas acreditam que os hormônios associados ao status elevado têm um efeito neuroprotetor nos peixes dominantes. No entanto, os resultados mostram que o impacto do estresse oxidativo no cérebro varia de acordo com a área cerebral analisada, indicando que nem todos os danos podem ser considerados prejudiciais. “Esses padrões podem nos dar pistas importantes sobre como o estresse social promove doenças no cérebro”, acrescentou Dijkstra.
Apesar das semelhanças comportamentais, os pesquisadores alertam para os limites de comparar o impacto do estresse social em ciclídeos com o de humanos. O estudo serve como modelo para compreender os mecanismos biológicos do estresse, mas ainda são necessárias análises mais específicas para desvendar os detalhes dessa relação.
O próximo passo, segundo Dijkstra, é realizar experimentos mais rigorosos para entender como o estresse social regula o estresse oxidativo no cérebro. Por enquanto, os ciclídeos continuam nos ensinando que, seja na água ou fora dela, a vida em sociedade tem seus altos e baixos — e seus impactos profundos.